Missionário da Consolata na Colômbia e no Equador...

quarta-feira, 22 de junho de 2011

SER TEOLOGO NOS DIAS DE HOJE

Edil Tadeu Pereira França – LMC

Téologo


Sei que é muito difícil propor-se um modelo de reflexão e interpretação da Palavra de Deus; pois o espírito da comunidade e os traços do pregador precisam favorecer a espiritualidade e a vivencia cristã da forma de evangelizar, e ao assistir um homem de Deus esmurrar a mesa do altar por duas vezes, chegando a derrubar o crucifixo, penso na qualidade de ser teólogo em uma igreja que nos abre para o discurso e a união através de nossa palavra, espelhada na Sagrada Escritura.

O grande sábio dos tempos da Reforma, Erasmo de Roterdam (+1536) observava: que "existe algo de sobre humano na profissão do teólogo", por isso fazer teologia não é uma tarefa como qualquer outra como ver um filme ou ir ao teatro. É coisa seríssima, pois se trabalha com a categoria "Deus" que não é um objeto tangível como todos os demais, Portanto, cabe à teologia ocupar-se também de outras coisas que não Deus, desde que se faça "à luz de Deus". Falar de Deus e ainda das coisas é uma tarefa quase irrealizável. Portanto não pode o teólogo se deixar levar pelas coisas meramente humanas, usando apenas sua capacidade de síntese pegando o fio central de sua pregação de forma harmônica e coerente de acordo com a comunidade, sua história e caminhada, e o jeito hermenêutico de entender a pregação por sua forma cultural. Mas ao falar sob a perspectiva de Deus,  que pressupõe conhecer previamente estas realidades de forma critica e não ingênua, respeitando sua autonomia e acolhendo seus resultados mais seguros. Somente depois deste árduo trabalho intelectual, pode o teólogo se perguntar como fica a comunidade quando confrontada com a experiência da Palavra de Deus? Como se encaixa numa visão mais transcendente da vida e da história?

Para teologizar um povo deve o teólogo ter convicção que o Deus crucificado não é um Deus poderoso e controlador, que trata de submeter os Seus filhos e filhas procurando sempre a Sua glória e honrarias. Mas é um Deus humilde e paciente, que respeita até ao final a liberdade do ser humano, mesmo que nós abusemos uma e outra vez do Seu amor. Não pode aquele que estudou Deus por essência usar de um modo apenas lógico, correndo o risco de enveredar-se por uma teologia que não merece este nome porque é preguiçosa e renuncia a pensar Deus. Apenas pensa o que os outros pensaram ou o que o que disseram, ou apenas suas palavras e intenções; mas a tarefa do teólogo, já ensinava o maior deles, Tomás de Aquino, na primeira questão da Suma Teológica é: estudar Deus e sua revelação e, em seguida, todas as demais coisas "à luz de Deus" (sub ratione Dei), pois Ele é o princípio e o fim de tudo; para daí então se colocar a fazer homilias ou sermões sem ofender a dignidade do homem igreja e a Divindade de Deus Criador. Portanto deve o teólogo ter bom senso para perceber quando seu discurso está animando a assembléia ou a desestabilizando,  é necessário que os teólogos desenvolvam a capacidade de ouvir criticas ou vozes que procuram construir a comunidade; uma vez que falar muito nem sempre significa estar atingindo seus objetivos; e acrescente-se a isto certos vícios gramaticais e uma linguagem ultrapassada ou discursos que transformam as homilias em discursos moralizantes e acusativos.

Em um processo incessante de preparação, através de leituras, cursos, atualizações, deverão nossos teólogos vencerem os obstáculos que limitam a preparação e a adequação ao tempo (cronológico - kronos) celebrativo e a diferença ambiental das comunidades e o anonimato da comunidade urbana, buscando então recuperar a mística litúrgica perdida para o crescimento secularizante dos fiéis, uma vez que a pregação necessita ser mais “convincente e as interpretações imparciais e comunicativas”, uma vez que a  Partilha da Palavra é reduzida à fala, pedindo então um teor mais positivo e comunicante em toda celebração da liturgia. Cabe aos teólogos reconhecerem o significado profundo, que é inesgotável na sua potencialidade e inserir o mistério pascal de Cristo e todas as dimensões da vida humana, através do gesto litúrgico, na vida comunidade. É inevitável que a figura de Cristo sirva de exemplo perfeito de integração vital. Mais que ninguém, deixe captar os encantos da natureza, de onde Ele tirava suas belas parábolas. Ele conhecia profundamente a história do seu povo, e sabia expressar o significado dos seus episódios; e hoje com o máximo de cuidados teologais, procurem os teólogos, dar forma e significados novos também aos ritos antigos, colocando neles os símbolos da entrega de sua vida por amor a toda a humanidade. Nunca deixe então o teólogo transparecer seu egoísmo ou sua pessoa, pois é de conhecimento que ele se diminua a fim de fazer com que o Cristo apareça.

O teólogo no mundo de hoje não pode esquecer que a Comunidade se mantém viva em sua história, pelos ensinamentos de uma forma teologal sejam eles novos ou repensados, porém sem esquecer que no período de Jesus era comum a junção de três elementos: as festas religiosas, o amor a Deus e ao próximo e a fé. Esta tríade se faz presente entre judeus e católicos até os dias atuais, jamais então poderá um teólogo usar do exercício da pregação para endemonizar as festas populares e seus acontecimentos, pois a concepção de espiritualidade está intimamente ligada à concepção de ser humano, basta fazer um estudo  da antropologia filosófica e a antropologia teológica - que integram os dados das ciências humanas - têm uma concepção unitária (não dualista) de ser humano. Mesmo na diversidade de abordagens e com enfoques diferentes, em outras palavras, o ser humano é totalmente (ou, integralmente) corpo, é totalmente vida e é totalmente espírito.

Seria muito interessante que os teólogos fizessem a experiência com as comunidades de unirem-se intimamente com o Cristo pascal, crescendo, e desenvolvendo-se na consolidação da Eucaristia nestes tempos de festas populares, na qual, cada elemento comunitário se une com Cristo na oferta da própria vida ao Pai mediante o Espírito. A vida cristã é fundamentalmente vida em Cristo pelo dom do Espírito, fruto da Páscoa. Ser espiritual significa viver segundo o Espírito de Deus. A espiritualidade tem a ver com tudo o que somos e fazemos, segundo o Espírito. Lembremos que a espiritualidade cristã é uma espiritualidade pascal: cristológica, pneumatológica e trinitária (comunitária - eclesial).

Que os teólogos aprendam como discípulos missionários, servir as comunidades com um amor paternal muito grande, e ter atitudes diferentes das que pude presenciar em uma festa popular; pois  não é colocando-se de forma superior ao Povo de Deus, que iremos dar testemunhos proféticos em nossos sermões, discursos ou homilias; mas sim com a humildade aprendida do Cristo é que transformaremos os corações aquebrantados.


sexta-feira, 10 de junho de 2011

Faleceu Ir. Maria Canisia Gouvea, “mãe dos pobres e das vocações sacerdotais”

Sucumbíos – Equador, 07 de junho de 2011

Queridas irmãs de N. Sra. de Sion e amigos/as em Cristo,

Desde estas terras amazônicas equatorianas, onde estou a três meses em uma missão junto aos povos indígenas da nacionalidade Kichwa , recebi a notícia da partida ao encontro do Pai de nossa querida Ir. Maria Canísia Gouvêa. Por isso, venho expressar meus sinceros sentimentos de amizade e de agradecimento a Deus por seus 60 anos de consagração religiosa a serviço das vocações e do cuidado especial aos pobres, que poderiam descrevê-la como “mãe dos pobres e das vocações sacerdotais”, entre elas a minha. Podemos reconhecer que como Jesus ela entregou sua missão: “Pai, eu te glorifiquei na Terra, completei a obra que me deste a fazer” (Jo 17,4); e como Paulo pode afirmar: “combati o bom combate, terminei a minha corrida, conservei a fé” (2 Tm 4,7).

Conheci a irmã Maria Canísia quando ela ainda vivia seus anos a serviço da comunidade Santa Edwiges, no bairro Bela Vista (em Paraíba do Sul-RJ), no ano de 1995, quando trabalhava num escritório perto da casa onde vivia. Daí fomos nos conhecendo e conversando com ela. Nestes anos, me acerquei mais à Igreja, fiz primeira comunhão e crisma, até que a partir de muitas conversas com ela e com outras pessoas, e vendo seu testemunho de vida, comecei meu caminho de discernimento vocacional.

Tenho que ressaltar a constante confiança em Deus e na Santíssima Virgem Maria (que fazem superar até mesmo os maiores sacrifícios físicos e espirituais) que me deixou a Ir. Maria em todos estes 9 anos de minha formação missionária, religiosa e em vistas de meu sacerdócio no próximo ano.

Por isso, em meio à dor de sua partida ao Pai, mas com a certeza que agora temos uma intercessora junto a Deus, gostaria de agradecer à querida Ir. Maria Canísia por seu exemplo que nos deixou e às irmãs de Sion por tão bela flor de religiosa que acolheram e ofereceram à Igreja de Deus.

Um cordial abraço unidos com minhas orações e amizade... “In Sion Firmata Sum”...


Ir. Júlio Caldeira, imc.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

MINHAS NOTÍCIAS depois de 3 meses em Sucumbíos - Equador...

Querid@s amig@s,
Já fazem 3 meses que cheguei aqui na missão de Palma Roja, em Putumayo (província de Sucumbíos), em plena selva amazônica do Equador, no limite com Colômbia e Peru... Estamos vivendo em plena floresta amazônica equatoriana, muito devastada pela exploração de petróleo e pelo desmatamento incentivado pelo governo para povoar a área... as pessoas que vivem aqui são basicamente campesinos que vieram nos últimos 30 anos e são provenientes de várias partes do Equador (principalmente das montanhas da Cordilheira dos Andes) e da Colômbia (fugidos da guerrilha ou pelos benefícios que tem esta região). Os indígenas que vivem neste município são, na maioria, da etnia Kichwa (se pronuncia kitchua) e vieram como quase-escravos de grandes fazendeiros e militares provenientes de outras regiões do Equador e Peru. Aqui existe muita precariedade no que se refere à saúde, educação, refugiados, condições básicas de vida, etc... No entanto, tem muito a nos ensinar sobre viver bem e em harmonia consigo mesmo, com os outros e com a natureza...

Em meio a tudo isso, nossa comunidade, atualmente está composta por mim, pelos padres Armando Olaya e Antônio Benitez, e pelos seminaristas propedêutas Juan Pablo, Steven e Danilo (todos colombianos)... Nossa vida diária está dividida em momentos de oração, trabalhos manuais (aqui plantamos arroz, mandioca, banana, milho, melancia, repolho e outros apropriados para o clima), estudos pessoais, encontros comunitários e acompanhamento das comunidades indígenas Kichwas que ficam nos rios San Miguel e Putumayo...

Algumas anedotas daqui: só temos luz elétrica das 4h as 7h da manhã e depois das 15h às 22h; a internet mais próxima está a mais de uma hora (e é mais lenta que tartaruga... as vezes para enviar um e-mail eu levo cerca de 5 minutos); uma ligação telefônica para o Brasil custa quase 3 dólares (cerca de 5 reais); aqui não temos carro (andamos de ônibus, carona em caminhonetes e caminhões, caminhamos muito...) nem empregada (fazemos tudo: cozinhar, lavar, limpar...)...  

Pastoralmente atuamos na Pastoral Indígenas: a nível de Equador, da província de Sucumbíos, de Consolata (Missionários e Missionárias e Leigos missionários da Consolata) e, de maneira especial, no acompanhamento a 23 comunidades indígenas Kichwas que estão às margens dos rios San Miguel e Putumayo (afluentes do rio Amazonas), sendo que algumas estão a 4 horas em barco a motor de onde vivemos... trabalhamos com a formação de catequistas, organização e acompanhamento de um grupo de jovens, visitas às famílias e celebrações periódicas a cada dois meses, ajudar na organização das comunidades em seus aspectos de saúde, educação, direitos humanos, etc... Outra atividade é o acompanhamento da Pastoral de Fronteiras nesta região entre Equador, Colômbia e Peru... e, por fim, acompanhar aos jovens que iniciam uma experiência de seminário chamado propedêutico (neste momento são três)...

Nosso Vicariato de São Miguel de Sucumbíos (identificado pela sigla ISAMIS) sofreu uma grande tempestade a cerca de 7 meses com a chegada da congregação ultraconservadora Arautos do Evangelho como administradores... no entanto, as pessoas não aceitaram seu projeto de Igreja que não levou em conta toda a história que viveu esta gente e que levou à construção de uma formosa e organizada Igreja-comunidade-ministerial onde se valorizam e tem a participação todas as vocações (sacerdotes, religiosos, leigos) e que caminha com os “dois pés” (evangelização e pastoral social), respeitando as diferenças de raça (indígenas, negros, campesinos etc.)... Depois de um tempo de resistência, há alguns dias eles deixaram o Vicariato... e, agora, depois da “tempestade” estamos avaliando os estragos (atualmente existe uma profunda divisão na igreja) e organizando para reconstruir melhor... Dom Gonzalo López Marañón, bispo emérito da província equatoriana de Sucumbíos, entra no seu sexto dia de jejum e oração pela reconciliação da província de Sucumbíos (“Para curar feridas e reconciliar Sucumbíos”). Peço vossas orações por nossa igreja de Sucumbíos... ver mais notìcias no blog: isamis2010.blogspot.com

Por agora é o que tenho por contar desta vivencia que estou fazendo, que está sendo alimentada por uma busca de conhecer este povo, sua cultura e maneira de viver... digo-lhes que há muitos momentos de dificuldades, mas outros que me fazem ver que Deus me chamou para estar aqui... e que me dão uma grande alegria... As pessoas pensam que todos os brasileiros sabem sambar e jogar futebol (então os que queiram vir por aqui, já comecem a praticar... hehehehehe)....

Que Deus continue a lhe abençoar e iluminar... Unidos na oração e na amizade...