Por: Júlio Caldeira, imc *
1. DEFININDO ALGUNS TERMOS:
- MISSÃO = Novo Testamento (grego) não usa esta palavra (mas usa envio, evangelizar...); provêm do latim missio = ser enviado a...
- VOCAÇÃO = vocare (latim) = chamado...
- LEIGO: A expressão “leigo” (como entendemos na língua portuguesa) está associada a alguém não qualificado, iletrado, da plebe, que não tem muito conhecimento sobre algo. Por exemplo: “fulano é leigo em história ou em medicina”. Na sua origem: provém do grego laikós = raiz em laós (povo) = Laós Theós (Povo de Deus); foi traduzido para o latim laicus = multidão, massa, povo (referindo-se àquele que não está qualificado para “as coisas de Deus”)
2. POVO DE DEUS:
Existem três estados de vivência da fé na Igreja (Povo de Deus):
1. Leigo = cristão batizado
2. Ministros ordenados = receberam o sacramento da Ordem (diáconos, padres, bispos)
3. Vida consagrada (religiosos e religiosas) = aqueles que se consagraram por um voto solene, normalmente em uma comunidade religiosa.
- Leigo, portanto, não é o inferior, aquele que não sabe, não participa ou não entende de nada, como parece ser o sentido da palavra. Leigo, na verdade, é aquele que vive sua fé na vida simples e cotidiana do mundo e da sociedade.
3. HISTÓRIA DO LEIGO/A NA IGREJA:
a) Primórdios:
- At 2,41-47: batizados, crentes, povo... “Todos participavam fielmente no ensino dos apóstolos, na união fraterna, no partir do pão e nas orações” (v.42).
- Existia o Povo de Deus, identificados como “os do caminho” (At 9,2) = e depois “cristãos” (At 11,26)
- Apóstolos + crentes
b) Primeiros séculos
- Igreja (Ecclesia) das catacumbas – mártires: Após a morte dos apóstolos, os cristãos se dividiam em ministérios (serviços à comunidade), sendo que a missão continuou através dos missionários itinerantes e com o compromisso individual de cada um que se considerava cristão: comerciantes, soldados, famílias, entre outros.
- Aos poucos foi se formando uma organização interna (sempre com a noção de serviços):
1. Episcopos: coordenador... (Tt 1,6-7)
2. Presbiteros: anciãos, chefes da comunidade...
3. Diakonos: servidores, visitadores... (At 6,1 ss.)
4. Outros ministérios... (Ef 4,11-12)
- Neste período, a Igreja desenvolveu sua base intelectual e doutrinal, sacramental e litúrgica, comunitária e de lideranças (baseado na colegialidade, autonomia das igrejas locais e nos Concílios locais e universais), na busca de manter a comunhão, a fraternidade e a unidade, e combater os conflitos internos e heresias
c) Igreja-Estado
- 3 séculos: Igreja das “catacumbas” – “mártires”...
- 313: Imperador Constantino dá liberdade de culto às religiões, inclusive aos cristãos (que eram menos de 10% da população do Império).
- 391: Imperador Teodósio torna o cristianismo religião oficial do “decadente” Império Romano.
OBS: O Imperador romano renunciou a usar o título de Pontifex Maximus, que foi assumido pelo bispo de Roma (papa), o “Sumo Pontífice”.
Missão: tornar os “pagus” (90% da população do Império, que viviam nos campos) cristãos... Começa a organização das paróquias...
d) hierarquia X laicato
- O termo laikós foi latinizado em laicus e passou a designar os cristãos que ouviam e obedeciam às ordens dos ministros ordenados (clero), “dispensadores dos poderes temporais e espirituais”.
- Agora temos dois grupos:
1. o clero como hierarquia, que se considera “a Igreja”
2. os leigos, que se tornam sinônimo daqueles que não sabiam o latim (língua oficial da Igreja), visto como pouco cultos, considerados incapazes de entender a Bíblia, livro para especialistas. (cristãos de “segunda categoria”).
- A partir daí a missão, a doutrina e a organização da Igreja ficou nas mãos da hierarquia, aumentando a distância com relação aos leigos.
e) Cristandade (séc. VI-XX):
1. aspectos importantes:
- Igreja – Império... (amigos no Poder)
- Cruz e espada caminham juntos
- Sociedade Perfeita
- Ser cristãos: trazer para dentro da Igreja...
2. divisões dentro do cristianismo:
- 1054: Divisão das Igrejas: Ocidente x Oriente
- 1530: Divisão do Ocidente: Católicos x Protestantes
- Séc. XIX-XX: surgimento das igrejas pentecostais (Assembléia de Deus, Deus é Amor, Universal do Reino de Deus...)
OBS: três ondas pentecostais no Brasil: 1) entre 1910-1950: pentecostalismo de migração (vindo, principalmente, dos EUA: congregacionais, presbiterianos, batistas...): Congregação Cristã (1910 – São Paulo: imigrantes italianos) e Assembléia de Deus (1911 – Belém/PA), que cresceram com as migrações, operários e fenômeno urbano. 2) déc. 1950-60: pentecostalismo fragmentado (fragmentação na metrópole: êxodo rural): época de cura e milagres aos que tentam se adaptar à metrópole (carentes, sofredores, empobrecidos) – ideal do “reavivamento”: Igreja do Evangelho Quadrangular (1951), O Brasil para Cristo (1955), Deus é Amor (1962). 3) final dos anos 70 até hoje: o neo-pentecostalismo (aproveitando a onde do marketing e dos meios de comunicação): prática da cura, exorcismo, teologia da prosperidade, soluções imediatas às massas ameaçadas – Igreja Universal do Reino de Deus (1977), Internacional da Graça (1980), Renascer em Cristo (1986) e tantas outras que surgem a cada dia...
3. Movimentos proféticos, contestadores e anticlericais: com o propósito de reformá-la, procurando voltar às origens (pobreza evangélica, comunidade, Palavra de Deus, laicato):
Exemplos:
* séc. 12: franciscanos, dominicanos...
* América (séc. 16): influência de Portugal e Espanha: leigos se organizaram em irmandades, associações, ordens seculares, confrarias, em torno a um santo de devoção e obras de caridade.
* OBS: Missão Jesuíta entre os indígenas no séc. XVI (que influenciou nossa catequese): “precariedade de uma fé assumida por medo, esvaziada interiormente, levando ao fingimento ao invés da conversão de coração e adesão da vontade” (Maria Cecília Domezzi). Mais do que continuar sacramentalizando é necessário evangelizar, oferecer oportunidade para conversão, par o encontro pessoal com Jesus Cristo. “MUITA CONVERSÃO E POUCA EVANGELIZAÇÃO!”
4. Século XIX – metade do XX
- A partir da Revolução Francesa e Industrial (séculos 18 e 19), com a secularização do mundo civil e das relações de trabalho, os movimentos de leigos crescem dentro e fora da Igreja. Surgem vários movimentos espiritual-caritativo-missionários, tais como o Apostolado da Oração, a Legião de Maria, a Santa Infância. As questões internas da Igreja eram confiadas ao clero e as externas eram o espaço onde os leigos atuam.
- O leigo passa a ser visto como um membro da Igreja e que atua na sociedade civil. Depois deste período, as questões sociais, a defesa dos direitos da Igreja, a busca da prática da caridade e do socorro aos necessitados, levou os leigos a se organizarem, sob a orientação da hierarquia, dando origem à Ação Católica, que com o tempo vai deixando de ser uma organização político-social para se tornar uma escola de formação dos leigos.
- O braço forte da Ação Católica no Brasil foram os “5 J” da juventude católica: JAC (agrária), JEC (estudantil), JIC (independente), JOC (operária) e JUC (universitária).
f) Concílio Vaticano II (1962-1965)
- Recuperação do conceito “Povo de Deus” a todos os batizados: leigos, ministros ordenados, vida consagrada...
- Passa-se a definir o real sentido do leigo na Igreja... descreve positivamente o leigo e a leiga, enfatizando o batismo e a participação na tríplice função de Cristo: sacerdote, profeta e rei.
OBS: Pelos sacramentos do Batismo e da Crisma, os fiéis leigos participam, a justo título, no tríplice múnus, sacerdotal, profético e real, de Cristo! Múnus sacerdotal = Incorporados em Cristo Jesus, unem-se a Cristo e ao Seu sacrifício, na oferta de si mesmos e de todas as suas actividades; Múnus profético = exercem a sua missão profética na medida em que se tornam ouvintes, anunciadores e testemunhas da Palavra. Múnus real = chamados para o serviço do Reino de Deus e para a sua difusão no mundo.
- Igreja Povo de Deus: evitando “restringir a tarefa profética, real e sacerdotal da Igreja somente ao papa, aos bispos e padres. Dessa definição deduz-se também a profunda igualdade entre os cristãos.”
- A hierarquia dever estar a serviço do Povo de Deus e não ao contrário.
4. PRINCIPAIS DOCUMENTOS DA IGREJA
QUE SE REFEREM AOS LEIGOS:
- Concílio Vaticano II: Lumen Gentium (LG), Apostolicam actuositatem (AA), Gaudium et Spes (GS), Ad Gentes (AG)...
- João Paulo II: Christifideles Laici (CfL)
- CELAM: Medellín, Puebla, Santo Domingo e Aparecida
- CNBB: Missão e ministérios dos cristãos leigos e leigas (doc. 62)
5. O LEIGO/A HOJE...
- Vocação... Ministérios... Pastorais... Movimentos... Comunidades... Conselhos...
"Vocação acertada, vida feliz!!!"
6. BIBLIOGRAFIA BÁSICA:
- COPPI, Paulo de. Igreja em Missão: Teologia e História da Missão, Animação Missionária e Nova Evangelização. São Paulo: Mundo e Missão, 2006. p.77-91.
- ROMANELLI, Francisco R. Missão do leigo. In: Revista Itaici, nº 19, março de 1995, p.3-10.
- CALDEIRA, Júlio C. Leigo, onde está a tua missão? In: Revista Missões, JAN/FEV 2010 – nº 01 – ano XXXVI, p. 15-16. In: http://www.julioimc.blogspot.com/
- MANZATTO, Antônio. Quem é leigo? In: www.oarcanjo.net/congressodeleigos
- VANZELLA, José Adalberto. Protagonismo do leigo na Igreja. São Paulo: Paulinas, 2005.
* OBS: Este esquema é parte do curso que ministrei em São Roque para ministros e agentes de Pastoral do setor Barueri (Diocese de Osasco), no dia 11 de setembro de 2010.
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